Steven Spielberg foi o homem que popularizou a nova Hollywood – e para alguns teóricos, o homem que matou a nova Hollywood. Após a grande estreia de seu Tubarão, uma nova espécie de expectativa revestiu cada lançamento dessa nova geração de cineastas, e os estúdios, que começavam a abrir as portas para a experimentação dos rebeldes da Califórnia, começaram a procurar o próximo Tubarão. A liberdade criativa estava fadada a encenar o seu próprio fim, e isso não demoraria muito. A partir desse prisma, podemos dizer que uma nova geração encontrou o seu Spielberg. Christopher Nolan colocou os filmes de super-heróis nos holofotes de uma audiência mais adulta, começando o que podemos chamar de a era de ouro dos quadrinhos no cinema. Mas foi Nolan que colocou, com a mesma série de adaptações de Batman, a primeira pá de terra no subgênero de filmes de aventura que ajudou a popularizar.
A degeneração mais extrema do clima iniciado por Nolan está em Quarteto Fantástico de Josh Trank, um filme despido de qualquer vontade de existir, cheio do simplismo sombrio genérico que raramente encontramos fora de músicas da coleção de um adolescente angustiado e apático.
Os créditos finais de Quarteto Fantástico funcionam como um relatório de um legista – os nomes associados com diferentes funções em um set de filmagens passam pela tela como os culpados pela falência múltipla dos órgãos de um filme que já é declarado morto aos 15 minutos de rodagem. Mas as massas precisam de um culpado, e mesmo em um filme cujo roteiro é formado por frases de efeito para trailers, cuja fotografia cria um constante clima hospitalar com um filtro azul angustiante, e cuja direção de arte coloca o principal vilão da Marvel como um turista recentemente chegado de um acidente em uma rave como o Tomorrowland, é a direção pífia de Josh Trank, o homem que desde o princípio tenta lavar as mãos e se isentar desse desastre, que parece inescapável até para o espectador menos crítico.
Josh Trank falha especialmente na direção de atores, e cada membro do elenco dá em Quarteto Fantástico sua pior performance da carreira. As reações dos protagonistas em todos os pontos de inflexão da história são sedadas, nulas, como as de crianças relutantes a cooperar com uma peça colegial.
É impossível, claro, não problematizar o papel ao qual Sue Storm, uma das principais figuras femininas dos quadrinhos, é relegada neste filme. Sue é uma excelente cientista, mas apenas faz os trajes do quarteto (um eco da mulher que apenas costura). Ela não ganha seus poderes na expedição ao planeta Zero, e sim por acidente, com a explosão do sistema montado pelos homens. E na cena final de ação, ela é esmagada pelo vilão, masculino, até que outro homem, Reed Richards, se ergue para salvá-la. Só não podemos acusar Sue Storm de não ter uma personalidade formada – afinal, nenhum personagem do filme apresenta esse fator.
Trank tenta atar dois momentos do filme com falas, gestos e movimentos de câmera idênticos. É nessa hora que ele dá o tiro de misericórdia em seu filme que definhava na frente dos nossos olhos. Afinal nessa cena ele mostra que sim, ele tinha um grande conceito para esse filme. Ele nega qualquer redenção a sua obra quando mostra para o espectador que essa não foi uma grande piada, e sim uma tentativa séria de autoria.
Nossos bolsos agradecem por esse filme ser a exceção à regra do 3D, porém. Como os membros do Quarteto Fantástico aprenderam na pele, em alguns momentos cruzar dimensões não vale a pena.
Nota: 2
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